domingo, 26 de dezembro de 2010

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

UM PEQUENO PARÊNTESE OU COMO TRANSAR COM CLARICE LISPECTOR


Se estou prenhe de idéia, então a leitura é o sexo, que é quando meu ser se relaciona com o outro[ser] em busca de prazer para parir, em périplo, a palavra que é vida.
Sem a presença substancial do outro não se faz sexo.
Assim, se nossos filhos são a forma de nos prolongarmos no outro, então o homem é Deus em seus filhos.
Toda escrita implica uma metafísica, mesmo que o limite para a linguagem seja seu uso.
“A dor de dente que perpassa esta história deu uma fisgada funda em plena boca nossa”.
Se sinto algo por Maria, cabe a Maria me dizer o que sinto, mesmo que eu acredite que “a verdade é sempre um contato interior e inexplicável”.
Só tenho vida interior ou contato íntimo porque tenho palavras para expressá-la.
Volto à Maria. Penso em Maria. A Maria que penso agora existe? Eu que penso Maria existo sem Maria?
Mas trago à luz algo de novo e puro que, no entanto, já era em Deus. Esse Deus todo que a tudo subsiste. Que é todo poderoso e que garante a verdade.
Nem por um átimo a verdade é relativa.
Não há nada que sustente a verdade porque Deus é a palavra em ato puro. Lembrando que Deus não poderia ser palavra fora do tempo, eterna, e sim, o eterno movimento da palavra.
Agora me pergunto o que vale mais a pena: discutir o sexo dos Anjos ou a sexualidade de Deus? Ou nem um nem outro, se me lembro que se Fernando Pessoa tivesse casado com a filha da lavadeira, nós não teríamos Álvaro de Campos, mas talvez fossemos felizes...

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Do Desejo, Hilda Hilst

I
Porque há desejo em mim, é tudo cintilância.
Antes, o cotidiano era um pensar alturas
Buscando Aquele Outro decantado
Surdo à minha humana ladradura.
Visgo e suor, pois nunca se faziam.
Hoje, de carne e osso, laborioso, lascivo
Tomas-me o corpo. E que descanso me dás
Depois das lidas. Sonhei penhascos
Quando havia o jardim aqui ao lado.
Pensei subidas onde não havia rastros.
Extasiada, fodo contigo
Ao invés de ganir diante do Nada.

***

IV

Se eu disser que vi um pássaro
Sobre o teu sexo, deverias crer?
E se não for verdade, em nada mudará o Universo.
Se eu disser que o desejo é Eternidade
Porque o instante arde interminável
Deverias crer? E se não for verdade
Tantos o disseram que talvez possa ser.
No desejo nos vêm sofomanias, adornos
Impudência, pejo. E agora digo que há um pássaro
Voando sobre o Tejo. Por que não posso
Pontilhar de inocência e poesia
Ossos, sangue, carne, o agora
E tudo isso em nós que se fará disforme?

Existe a noite, e existe o breu.
Noite é o velado coração de Deus
Esse que por pudor não mais procuro.
Breu é quando tu te afastas ou dizes
Que viajas, e um sol de gelo
Petrifica-me a cara e desobriga-me
De fidelidade e de conjura. O desejo
Esse da carne, a mim não me faz medo.
Assim como me veio, também não me avassala.
Sabes por quê? Lutei com Aquele.
E dele também não fui lacaia.